Em ambientes com baixa eficiência, a prática pode trazer importantes vantagens competitivas

É voz corrente entre consumidores e empresários que o Brasil tornou-se um país caro. Um lugar em que produtos não raro custam 4 ou 5 vezes mais do que no exterior. Quando falamos em serviços, frequentemente se junta o caro ao ineficiente.
Economicamente, é uma situação grave e preocupante. A mão de obra, especialmente para a pequena e média empresa, traz em si um dilema que pode ser expresso da seguinte forma: o salário oferecido é paradoxalmente caro para quem paga (em função principalmente de todos os encargos e as provisões, que geralmente dobram o custo) e muito modesto para quem recebe (já que menos da metade do que foi gasto chega até esse funcionário). De fato, que funcionário consegue sobreviver de maneira satisfatória em uma grande cidade brasileira, sustentando sua própria residência e família, ao ganhar por volta de R$1.500 por mês? Ao mesmo tempo, quantas empresas não têm dificuldade em assumir um custo, por esse mesmo funcionário, de mais de R$3.000 por mês? O Brasil tornou-se um país caro antes que seus habitantes e empresas se tornassem ricos.

São conhecidos os males que parasitam o nosso sistema econômico e o tornam caro: impostos que engolem quase 40% de tudo que produzimos, sistema tributário trabalhoso e inseguro, legislação trabalhista anacrônica, baixo nível de investimento público e privado, pouca atividade de pesquisa e desenvolvimento. O periclitante estado do sistema educacional brasileiro também não é favorável ao aumento da produtividade do trabalho: enquanto na China e na Índia a melhora na produtividade da mão de obra foi responsável por 91% e 67% (respectivamente) do crescimento econômico entre 1990 e 2012, no Brasil foi responsável por apenas 40% do crescimento do PIB, segundo a consultoria McKinsey. Já se tornou lugar comum a reclamação entre profissionais de recursos humanos de que é difícil o recrutamento de profissionais devidamente qualificados para determinado cargo.

No entanto, é exatamente nesse problema que reside uma importante oportunidade para os empreendedores brasileiros: podemos transformar a produtividade em um grande diferencial competitivo. Em um ambiente em que pouquíssimas empresas implementam de maneira consistente medidas que garantam maior produtividade, essa prática se torna uma maneira extremamente eficaz para garantir vantagem frente à concorrência. O raciocínio é simples: na medida em que seu empreendimento (ou mesmo individualmente, como profissional) se torna mais produtivo, você pode produzir a mesma quantidade de bens e serviços, mas com menos insumos (capital e trabalho). A porção relativamente menor de recursos utilizados garante que esses bens e serviços possam ser oferecidos por custos menores e/ou com maiores margens de lucro.

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Capa do livro Sonho Grande (Foto: Divulgação)

Aos que queiram se aprofundar em histórias e técnicas vencedoras quando o assunto é produtividade, vale a pena ler o livro Sonho Grande, da jornalista Cristiane Correa. Nele estão generosamente retratados os princípios e a história do trio (Beto Sicupira, Marcel Telles e Jorge Paulo Lemann) que ergueu a AB Inbev e tantas outras empresas. Veja aqui uma seleção de dez princípios que você encontra nessa obra e retirado de comunicação interna do Banco Garantia, onde tudo começou:

“1. Gente boa trabalhando como um time e com objetivos comuns é o ativo mais importante e diferenciador de uma instituição;
2. Encontrar, treinar e manter gente boa é um esforço constante e permanente de todos;
(…)
5. A principal função dos chefes é escolher pessoas melhores do que eles para dar continuidade à instituição;
6. Liderança é exercida por ideias claras e pelo exemplo diário, nos mínimos detalhes;
(…)
9. A boa instituição está sempre querendo melhorar. Seja qual for o grau de sucesso, existe a possiblidade de melhoria. Isso garante uma vantagem duradoura competitiva;
10. Reduza sempre os custos. É uma variável sobre o seu controle e que garante a sobrevivência;
11. As inovações que criam valor são úteis, mas copiar o que funciona é bem mais prático.
12. A melhoria e a educação contínua dos associados têm de ser um esforço permanente e incorporado às rotinas;
(…)
17. Ética total é essencial;
(…)
20. Um sonho grande, desafiador, comum e essencial ajuda todos a trabalhar na mesma direção.”

O leitor atento certamente não deixará de perceber a força motriz que norteou a vantagem competitiva do trio: boas práticas de trabalho que visam à melhora contínua da produtividade. Esses princípios simples, porém de grande poder, fariam muito bem ao país se aplicados por profissionais, empresas e governo com muito mais empenho e clareza. Os que o fizerem têm chances reais de se destacar e criar trajetórias de crescimento exponencial.

Por fim, há um porém – e, em época de eleições, nunca é exagerado lembrá-lo. Parte do problema da produtividade brasileira (e, portanto, dos custos de vida) terá de ser resolvida coletivamente, pelas vias institucional e política: aumento dos investimentos públicos (que melhoram o potencial de crescimento do PIB sem inflação), melhora na qualidade do gasto com educação, promoção da competição entre as empresas, sistema tributário mais simples e menos oneroso, retirada de incentivos perversos para que as empresas não cresçam (como os limites de faturamento para que algumas modalidades societárias gozem de benefícios tributários), diminuição do protecionismo no comércio internacional e outras mais, como a boa administração de risco, que será um assunto futuro da coluna Radar Empreendedor. Fique ligado.

 

Fonte: evistapegn.globo.com